sexta-feira, julho 16, 2010

Embrulho de Verão

Pediste-me em silêncio que escrevesse para ti. Sobre aquele fim-de-semana, como tu lhe chamas. Sobre aquele pequeno mundo que vivemos em momentos. Como aquele sol, e os mosquitos que me incomodam. Os insectos voadores, tu sabes. Quando te ris sempre que assobio a uma abelha. Não acreditas. Mas carregas nos botões dos peões nos semáforos. Porque acreditas que eles ficam verdes ao toque. Eu sei, queres que te fale daquele espaço.

Aqueles dias deixaram-me sôfrega. Sedenta de mais. De mais espaço. Ali no meio do sol, com o som dos grilos à noite. E as rãs que não encontrávamos. E o mergulho contido, depois do chuveiro antigo, com aquela manivela. Tinha um truque. Que guardaste para ti enquanto me olhavas a tentar, desesperadamente, encontrar água para tanto calor. Mas antes, muito tempo antes, tínhamos já refilado com a lentidão dos empregados no restaurante (sim, somos da cidade). Mas sabe bem um pouco de calma. Só tínhamos que nos habituar ao espaço.

O espaço de que queres que eu fale. Do corpo cheio de água, e calor. De um jantar em que alguém provocava um cão. Furioso. E nós ali, a dividir o peixe. Aliás, dividimos pouco. Comeste o melhor quase todo. Mas soube-te bem e não te quis tirar esse prazer. Podia só ficar ali a olhar para ti.

Sabemos os dois o que queremos. O que somos e o que podemos ser. Parados no tempo. Sinto-me assim contigo. Contei-te que no outro dia disse tranquilamente "eu que agora tenho 23 anos". Tinha sim. Mas não agora. Desculpa. Estou a falar de mim e não do espaço. Mas percebes que estamos nós aqui nestas palavras. Nas letras perdidas e baralhadas entre elas. Para que um dia as possa voltar a dar.

Quero-te falar do pequeno-almoço e do Cabo. Do farol. A tua paixão pelos faróis. Dizer-te devagarinho que adorei as geleias (sim, eu sei) e o sumo de laranja. E o sossego matinal. Que cheirei o fundo do mar naquela encosta, que me apeteceu agarrar-me às costas da cegonha e voar um pouco. Não estava frio. Nós não gostamos nada de frio. Digam o que disserem. E podia ter dormido ali abraçada. Encostada a ti, ao de leve. Porque sabes que preciso de me sentir um pouco protegida.

Gosto de nós assim. No calor. No refresco. No aconchego. Mas tive medo de escrever. Não queria que fosse qualquer coisa. Não me encontrava. Tu conheces bem essa sensação. Sempre que preciso dela, porque preciso às vezes de não me encontrar, acabo por me encolher.

Angustia-me a chegada. O caminho de regresso, mas também sabes isso. Estranho, porque normalmente até gosto do regresso. Só contigo é que não. Mas são horas. Depois passa. E tenho-te a ti. Entre letras perdidas e baralhadas entre elas.

Esqueci-me de te falar do jogo de cartas. Aquele que eu ganhei, lembraste? Se te disser que foi o meu momento, tu não acreditas. Não foi o jogo. Não foi a vitória. Foi só aquele momento, em que durante uma hora ficámos os dois. Falámos os dois. E estivémos em nós. A falar de banalidades que nos diziam respeito. No fim, demos um beijo.

No fim, tivémo-nos. Tal e qual como seríamos.