quinta-feira, setembro 01, 2011

As tuas sete colinas

Lembras-te quando te conheci e ficava sem ar? Quando chegava a casa cansada de mais um dia de trabalho e ficava chateada contigo porque não me davas mimos. Lembras-te quando ainda não conhecia os traços da tua personalidade? Quando me tentava habituar a ti. E é estranho, não é? Contigo foi sempre tudo ao contrário. Cansei-me de ti numa fase inicial, das subidas, das descidas, de uma inconstância que me deixava confusa, perdida. Tinha até a mania de que se voltasse para "casa" mais cedo, evitava ter de me chatear contigo frequentemente. E fugia para longe de ti. Descansava de ti. Achava que não te tinha dado tempo suficiente, mas sabia que tu gostavas mais de mim. O problema era meu e não teu, entendes? Um cliché que encaixa na perfeição.

Depois, com o passar dos meses encontrei em ti um refúgio meu. Um espaço que deixaste para mim e onde aprendi a conhecer-te. Comecei a decorar os teus horários, as tuas rotinas, os teus dias de mau humor e aqueles em que, surpreendentemente, me deixavas de queixo caído. Acompanhei-te. De sorriso na calçada, foste-me ensinando que sim. Que poderíamos dar certo, que até podia fazer sentido. Mas as relações são sempre assim: ainda não era definitivo. Decidi que ainda podíamos correr o risco. E fugi novamente. Não te olhei nos olhos, não provei do teu suor, não deixei que me abraçasses. Mas aí, nesses meses, senti a tua falta. Aquele aperto no peito. Inicial.

Quando dei por mim, já te conhecia há demasiado tempo. Tinhas observado, em silêncio, todos os meus desvarios. Nunca disseste nada. Querias-me só para ti e nunca disseste nada. A mim, agradava-me a ideia de me quereres só porque sim. Durante oito anos abraçaste-me todas as noites. Tu, o teu calor ou o teu frio. Confesso que gostava mais dos dias em que tinha de me agarrar a uma colcha de lã porque me congelavas. Havia dias assim. E, que raio, tu sabes o quanto eu gosto desses dias, não sabes? É deles que me vou lembrar nesta nova aventura.

As noites de calor, aquelas em que me deixavas percorrer o teu corpo, entre subidas e descidas; aquelas em que me deixaste ficar a olhar para ti num qualquer miradouro sem nada dizer. Já te disse também que prefiro o da Nossa Senhora do Monte, não já? Foi sempre aí que te mostrei, cheia de orgulho. E foi sempre aí que vi o brilho nos olhos dos outros. Um brilho de quem percebe a paixão. E o sol, essa luz que vem de ti. Essa luminosidade que se vê em roupa velha estendida nos estendais que acolhes nas tuas sete colinas.

É isto. Queria dizer-te que vou sentir a falta da tua luz. Do teu sobe e desce. Da tua pele enrugada pelo tempo, dos teus caminhos que desprezam os saltos altos, dos teus carris escorregadios e traiçoeiros, do teu rio. Posso dizer do nosso rio? A nossa ponte, a antiga - porque não gosto da nova. Gosto do teu sabor, aquele da marginal, sabes? Sou viciada nesse sabor.

Vou ter de partir, mas desta vez, não estou a fugir. Quero-te mais. Quero-te muito. Queres-me a mim. Quando voltar, reencontramo-nos. Guarda-me um pouco do teu sabor. Vou querer senti-lo quando voltar. E, se te lembrares, quando me fores buscar, leva Amália contigo. Por tua causa, ou por causa dela, vou mais leve. Nesse fado. Nessa boleia. Não vou acabar a dizer o teu nome. Isso sim seria cliché.

Guarda-te para mim.
[E digo-te porquê: tenho borboletas na barriga]

8 comentários:

Mário Ventura disse...

Lisboa tem mais encanto... com as tuas palavras.

Ana disse...

muito intenso kat*

Unknown disse...

you are invited to follow my blog

Sarita disse...

Ela também sente a tua falta. :)

amandio sales disse...

Olá gostei do seu blog e do texto muito bom!
Visita o meu blog e o que faço parceria http://clubnovosautores.blogspot.com/
Atenciosamente:
Amandio Sales
Abraços...

SM disse...

Adorei....está muito bem escrito...confesso, até fiquei com inveja! Mas da positiva...quem escreve assim, sabe o que escreve e tem uma imensa alma!

Marcelo disse...

Parabéns pelo blog esta muito bonito! Gostei muito dos artigos estão ótimos! ótima tarde!

Marcelo Borges disse...

Excelente o artigo ! gostei! e que Deus ilumine e abençoe a pessoa que ler essa mensagem !